Por que comemoramos o Dia do Professor no dia 15 de outubro?

Por Zevaldo Sousa (educador e historiador)

Desde muito jovem, tenho me fascinado sobre como datas simbólicas revelam camadas de luta, memória e poder e hoje, no 15 de outubro de 2025, estamos celebrando o que chamamos de Dia do Professor no Brasil — e sinto que, ao olhar para essa data, retorno a um entrelaçamento de vidas, iniciativas e políticas que nos ensinam o quanto a docência é sempre algo maior do que sala de aula.

Neste exercício de memória, convido-vos a caminhar comigo por três personagens que ajudam a compor a narrativa desta homenagem: Salomão Becker, Antonieta de Barros e João Goulart.

Cabe destacar neste início de texto que Dom Pedro I, ao promulgar a Lei Imperial de 15 de outubro de 1827, tinha como objetivo a criação de escolas de primeiras letras em todas as províncias do Brasil e até regulamentava a profissão docente, estipulava o salário dos professores; contudo, não era alusiva ao Dia do Professor. Todavia, ao longo da nossa história, a data foi ganhando histórias e simbolismos que resultaram na escolha da data como referência ao Dia do Professor.

E, com deferência às três personalidades marcantes, homenageamos todos os professores que se conectam diariamente ao Blog do Lab de Educador.


1. Salomão Becker: o professor que viu exaustão e propôs congraçamento

Em minha trajetória como professor e historiador, sempre me emociono com histórias de educadores que se dedicaram verdadeiramente à educação e, podemos afirmar após breve pesquisa que Salomão Becker era um desses professores. Ele era professor no Ginásio Caetano de Campos, em São Paulo — e por volta de 1947 percebeu que o professor também se esgotava, que o segundo semestre escolar estendia-se sem trégua, sem um momento coletivo de reflexão ou afeto entre colegas e alunos.

Neste sentido, Becker se questionou: por que não reservar um dia para descanso, abraço, confraternização — um dia para os professores serem vistos? Ele sugeriu que os estudantes trouxessem pequenas ofertas (doces, salgadinhos) e que todos cuidassem de si. Essa ideia, nascida da empatia, rapidamente ganhou adesão nas escolas paulistas. Ele chamou a atenção para algo que ainda hoje é atual: o cuidado docente, a empatia, a saúde mental, a necessidade de pausar, pensar e reconhecer o valor profissional entre pares.

Mas Becker sabia que não bastava o gesto simbólico — era necessário um referencial jurídico e histórico. Por isso ele escolheu a data 15 de outubro, em alusão ao decreto imperial de 1827 que instituiu o ensino elementar no Brasil. Essa escolha não era arbitrária: buscava conectar o afeto à autoridade legal — como se dissesse: “o professor é central porque sempre foi central, desde o começo”.

Com isso, em 1947, São Paulo comemorava o primeiro evento em homenagem aos professores e no ano seguinte, o Governador de São Paulo, Adhemar de Barros promulgou a Lei Estadual nº 174, de 13 de outubro de 1948, que instituiu o Dia do Professor no Estado.

Ele se tornou, assim, uma espécie de portador de semente pedagógica para aquilo que viria a ser a celebração nacional da profissão docente.


2. Antonieta de Barros: política, voz negra e instituição da lei estadual

Enquanto Becker atuava em sala de aula e nas escolas de São Paulo, em outro canto do país surgia uma mulher negra que unia docência, jornalismo e ativismo político: Antonieta de Barros. Nascida em Florianópolis (SC) em 11 de julho de 1901, filha de Catarina Waltrich — que havia sido escravizada — Antonieta quebrou as fraturas sociais, rompeu preconceitos ao afirmar-se como professora, escritora e, logo após a redemocratização do Brasil pós-ditadura Varguista, tornou-se a primeira deputada estadual negra em um estado majoritariamente branco. 

Em 1948, já ocupando a Assembleia Legislativa catarinense, ela propôs e aprovou a Lei nº 145, de 12 de outubro, que instituía o Dia do Professor no estado de Santa Catarina, definindo a data de 15 de outubro como feriado escolar estadual. Vale destacar que esse é o primeiro registro histórico de legislação que homenageia o Professor.

Em seu discurso na tribuna, Antonieta evocou não só o valor simbólico de homenagear os professores, mas a necessidade de reconhecer formalmente seus méritos. Ela resgatou a ideia de Becker, mencionando que sua proposta se inspirava no gesto de congraçamento docente que ele havia sugerido, e defendeu que esta homenagem deveria atingir toda “a grande Legião Anônima” que ensina nas escolas. 

Antonieta não era apenas legisladora: era uma defensora da educação como instrumento de emancipação social, especialmente em um país marcado por desigualdades raciais e de gênero. Sua trajetória me serve como inspiração: mostrar que a política é terreno de transformação e que o reconhecimento do magistério deve vir não apenas do afeto, mas da institucionalidade. 


3. João Goulart: o Decreto Federal nº 52.682 e a expansão nacional

A lei catarinense de Antonieta pavimentou um caminho local, mas ainda restava o salto para que o Dia do Professor se tornasse um marco nacional. A esse passo contribui João Goulart, então presidente da república. Em 14 de outubro de 1963, Jango sancionou o Decreto Federal nº 52.682, declarando 15 de outubro como “feriado nacional escolar” e estabelecendo que as escolas promovessem, anualmente, solenidades alusivas à data com participação de alunos e famílias.

Coincidentemente, hoje atuo como professor da Escola Municipal Presidente João Goulart, localizado no bairro Santa Etelvina que, segundo dados do IBGE, é a 13ª maior favela do Brasil e meus alunos da Educação de Jovens e Adultos compartilham comigo um pouco da sua experiência e esse é mais um momento muito especial após um dia de trabalho atuando em mais duas escolas.

Com esse decreto, a homenagem deixou de ser regional para se transformar em dever cultural e simbólico em todas as instituições de ensino. O gesto de Becker e a lei de Antonieta encontraram respaldo num ato federal que reconheceu institucionalmente a relevância dos professores para a nação.

Mas, como historiador e educador, sei que decreto formal não basta: o desafio permanece em transformar essa celebração simbólica em políticas públicas reais, que garantam valorização salarial, condições de trabalho dignas e formação contínua. Se Jango nos legou o reconhecimento formal, cabe a nós — professores, gestores, sociedade — garantir que essa homenagem não seja apenas um dia no calendário, mas uma postura permanente de respeito e investimento.


Ao refletir sobre a trajetória da história do Dia do Professor – de Becker à Antonieta, até o ato federal de Goulart — percebo um movimento dialético entre afeto e institucionalização, entre a ação cotidiana e o gesto legislativo.

  • Becker aproximou-se da dor docente, sensibilizou com empatia e sugeriu uma pausa vivida.
  • Antonieta de Barros ousou levar essa sensação ao campo da política, formalizando o reconhecimento enquanto agente público.
  • João Goulart alargou esse gesto à escala nacional, transformando homenagem local em ritual coletivo e institucional.

Mas como educador e historiador, sinto que a verdadeira homenagem se faz no cotidiano: na voz que escuta o professor, na política que investe, no currículo que reconhece o papel deste profissional como produtor de cultura, cidadania e futuro.

Neste 15 de outubro, convido meus colegas, estudantes e toda a comunidade escolar a não apenas comemorar, descansar, meditar, mas a reivindicar: que o reconhecimento simbólico se transforme em ação permanente — para que o professor deixe de ser “especial num dia” e passe, de vez, a ser prioridade sempre.

Cabe lembrar que, desde 1994, existe o Dia Mundial dos Professores, celebrado em 5 de outubro, instituído pela UNESCO para marcar a Recomendação de 1966/1997 sobre o Estatuto dos Professores.


Referências

ALESC (Santa Catarina). Lei nº 145, de 12 de outubro de 1948. Institui o Dia do Professor e determina feriado escolar em 15 de outubro. Ato Normativo nº 158. Disponível em: <https://leis.alesc.sc.gov.br/ato-normativo/158>Acesso em: 15 out. 2025.

ALESC. Antonieta de Barros. Memória Política de Santa Catarina. Disponível em: <https://memoriapolitica.alesc.sc.gov.br/biografia/68-Antonieta_de_Barros>. Acesso em: 15 out. 2025.

BBC BRASIL. Como um professor de escola pública e uma parlamentar negra criaram o Dia do Professor há quase 80 anos. BBC Brasil, 2025. Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/articles/c8r0xpnm0xlo>. Acesso em: 15 out. 2025.

BRASIL. Decreto nº 52.682, de 14 de outubro de 1963. Declara o dia 15 de outubro como feriado escolar dedicado ao professor. Disponível em: <https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1960-1969/decreto-52682-14-outubro-1963-458043-publicacaooriginal-1-pe.html> ou na versão consolidada no site do Planalto. Acesso em: 15 out. 2025.

BRASIL. Lei nº 3.839-8, de 15 de outubro de 1827. Institui o ensino elementar no Brasil. Disponível em: <https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei_sn/1824-1899/lei-38398-15-outubro-1827-566692-publicacaooriginal-90222-pl.html> Acesso em: 15 out. 2025.

CORREIO BRAZILIENSE. Por que o 15 de outubro foi escolhido como o Dia do Professor. Correio Braziliense, 15 out. 2025. Disponível em: <https://www.correiobraziliense.com.br/aqui/2025/10/15/por-que-o-15-de-outubro-foi-escolhido-como-o-dia-do-professor/>. Acesso em: 15 out. 2025. 

HOJE MAIS. O legado de Salomão Becker e Antonieta de Barros: os educadores que deram origem ao Dia do Professor no Brasil. Hoje Mais, 2025. Disponível em: https://www.hojemais.com.br/tres-lagoas/noticia/cotidiano/o-legado-de-salomao-becker-e-antonieta-de-barros-os-educadores-que-deram-origem-ao-dia-do-professor-no-brasil. Acesso em: 15 out. 2025. 

IFSP – Campus São José do Rio Preto. A história por trás do Dia do Professor. São José do Rio Preto, IFSP, 15 out. 2024. Disponível em: <https://sjp.ifsp.edu.br/component/content/article/63-noticias/443-a-historia-por-tras-do-dia-do-professor>. Acesso em: 15 out. 2025. 

OESPECIALISTA (Safra). Antonieta de Barros, a professora que criou o Dia do Professor. O Especialista, 15 out. 2021. Disponível em: <https://oespecialista.safra.com.br/a-professora-que-criou-o-dia-do-professor/>. Acesso em: 15 out. 2025. 

SÃO PAULO (Estado). Lei nº 174, de 13 de outubro de 1948. Declara feriado escolar no “Dia do Professor” em 15 de outubro. Disponível em: <https://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/lei/1948/lei-174-13.10.1948.html> Acesso em: 15 out. 2025.


Como referenciar este texto: 

Blog do Lab de Educador.  Por que comemoramos o Dia do Professor no dia 15 de outubro? Zevaldo Sousa. Publicado em 15/10/2025. Disponível em <https://blog.labdeeducador.com.br/2025/10/por-que-comemoramos-o-dia-do-professor-no-dia-15-de-outubro.html>. {codeBox} 

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